De todas as mulheres de minha família, a que eu mais me fascinava era uma senhora a quem todos chamavam de Tia Regina. Ela odiava que a chamem de tia, e sempre nos corrigia, em meio a seu praguejar, que não a chamassem assim.
Ninguém jamais soube exatamente a idade dela. Alguns chutariam uns 70 outros quase 80 mas a educação e intimação dos mais velhos nos impediu saber sua verdadeira idade.
Sabemos que ela foi uma mulher muito bonita, a mais bonita de todas da família. Quando mostrava suas fotos antigas, coisa que adorava fazer, sempre víamos uma linda mulher, com a aparência das antigas divas do cinema americano. Loira de cabelo prata, olhos vivos e brilhantes, com uma pele bonita e sempre bem vestida, nunca a vi sorrindo em nenhuma foto.
Ela foi escondida para a Itália na segunda guerra mundial, tinha 15 ou 16 anos e serviu como voluntária numa enfermaria. Alguns dizem que ela fugiu porque estava grávida, ela me contou que queria apenas embarcar em uma aventura. E dizia sorrindo que os italianos eram lindos de doer.
Gostava do modo como ela fumava um daqueles seus cigarros finos, em piteiras antigas de marfim, já amarelado e manchando. Sempre acompanhado de um copo comprido preenchido de seu Campari. Minha mãe diz que é bebida de antigas meretrizes. Minha tia dizia que meretriz é a mulher que se casa sem amor.
Ela sempre ouvia música em um quartinho separado em um canto de sua casa. Lá ninguém podia entrar e diversas vezes, eu ficava sentado na beirada da porta, escondido, ouvindo suas cantoras de voz suave e línguas estrangeiras.
Um dia ela me chamou enquanto ouvia música. Primeiro corri assustado e então ouvi ela me chamando baixinho, dizendo que era para eu sentar com ela e ouvir de dentro.
Me colocou em seu colo e ficamos ouvindo um bom tempo as músicas tocadas pela agulha. Ela tinha um sorriso no rosto e me pediu para eu abrir uma gaveta, que se encontrava numa escrivaninha velha, eu tinha 8 anos, aonde tinha uma foto antiga e em preto e branco de um piloto. Ele era muito bonito.
“Esse meu filho é o único homem que eu amei.”
Ficamos ouvindo o disco até o fim e com a foto em nossas mãos. Então ela me abraçou com força e tocou meu cabelo enquanto beijava meu rosto.
“Nunca peça uma mulher
Ela morreu nessa madrugada. Sem idade, amando apenas um homem e foi muito feliz por isso. Vou sempre me lembrar da tarde que ouvimos música juntos, do cheiro de seu Capri, de suas cantoras européias e do Campari em seu copo.
Um comentário:
essa Tia Regina deve ser gente boa pacas. Outrora, conheci uma Tia Helena que nem minha tia é, mas gostei por demais da figura. Carioca, adora uma Itaipava e não larga seu Charm por nada na vida. Tia Leninha e Tia Regina são as tias do Rio. Saudoso Rio.
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