terça-feira, 22 de março de 2011

Marquês de Sade

- Está passando uma peça do Sade na Funart esse final de semana.
- Aham.
- A gente poderia sair um pouco e curtir. Quanto tempo faz que não vamos ao teatro?
- Ah sei lá... uns dois meses?
- Vamos?

Acordamos cedo. Compramos os ingressos. Tomamos uma cerveja enquanto ouço ele me dizer o que leu sobre o Sadê. Tudo tão superficial e cheio de erros que aposto que pesquisou na Wikipédia uma hora após saber da peça.

- Está aí um cara que sabia o que realmente queria da vida. É isso mesmo. As pessoas deveriam fazer o que desejam, ser quem desejam.
- Acho que a peça vai começar daqui a pouco. Vamos indo?

Durante a peça noto um garoto sem graça. Inicialmente rindo, depois cruzando suas pernas e então indignado e torcendo o nariz. Suas mãos estão suadas quando segura as minhas e vamos até a carro.

- Ele era gay né?
- Acho que não.
- Como não? Você viu os caras naquela peça?
- Acho que ele era o sexo. Simples assim. Sem nenhuma barreira ou contextualização. Era exatamente o tesão que você sentiu ao ver duas mulheres se pegando e também o tesão em dois caras sendo enrabados por um toco de madeira de 30 centímetros. Ele era tudo isso cara.
- Mas você concorda com ele? Tipo... Você gostou dessa porcaria de peça?
- Gostei.

...

- Sério que você gostou da peça?
- André eu acabei de tomar um banho estou muito na pilha de ir dormir.
- Aquela mulher foi estuprada no final da peça. ES-TU-PRA-DA!
- Acho que aquela mulher foi estuprada várias vezes em sua vida e chamou isso de casamento. Acho que milhares de mulheres são estupradas todos os dias aos serem espancadas. Acho que todas as mulheres são estupradas todos os dias muito além do estupro.
- ...
- Aquilo foi um aviso. A vilania deveria ser aplicada sobre os vilões. É nessa constância do chocar que está a verdadeira obra do Sade. É sobre o quebrar conceito, destruir tabus, jogar em nossa cara o que todos consideramos feio e obsceno, para mostrar que espécie louca a instintiva nós somos e como todos os dias fugimos disso.
- Não sabia que você conhecia Sade.
- Você não me conhece André essa é a verdade. Boa noite.