quinta-feira, 31 de julho de 2008

Entre lençóis

Estava de madrugada e os dois já estavam comendo manga cortada em pequenos pedaços coberto com leite condensado.

- Não sei por que ainda como isso com você.
- Por que é delicioso.
- É nojento. Deveríamos estar comendo pelo menos morango. Ou usando cobertura de chocolate quente. Manga com leite condensado... Isso não combina.
- É doce, sempre tenho vontade de comer doce após fazermos amorzinho.
- Não é amorzinho o que fazemos. Isso é uma excelente foda.
- Para mim sempre vai ser amorzinho.

Ela lambe a colher suja de leite condensado e ele não consegue deixar de pensar que em poucos instantes essa boca estava em seu pau.

- Vamos ir ao cinema amanhã?
- Por que não assistir um filme aqui em casa?
- Porque sempre fazemos isso. Qual é seu problema em sair um pouco?
- Você. Não tenho vontade de sair ao ver você se vestindo.

Ela dá um daqueles sorrisinhos de canto e então lhe dá um beijo grudento e doce.

- Odeio leite condensado.
- Então pára de comer.
- Vou tomar um banho. Quer vir comigo?
- Depois. Ainda estou um pouquinho dolorida.
- Lembre-se de por essa vasilha na pia, senão vai encher de formigas.
- “senão vai encher de formigas...”

Ele sorri pegando a toalha e vai ao banheiro, com o som do chuveiro alto e ritmado ela termina o seu doce e consegue dizer o que está entalado em sua garganta.

- Te amo.
- O que você disse? – A voz vem embolada do banheiro.
- Que vou pôr a vasilha na pia.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Pássaro de asas quebradas

Encontrei fantasmas saltando de armários mofados e a muito esquecidos. Muitos passaram tão rapidamente que se tornaram borrões de ópio. Mas um deles me encarou nos olhos e me obrigou a ouvir velhas histórias.

Carregava um olhar vazio e desfocado, como um embriagado ou uma criança que esperou por horas, até perceber que fora abandonada.

Não queria que esse olhar estivesse tão diretamente voltado a mim. Não queria que ele mostrasse um passado tão vivo, que pudesse tocar ao afastar seu desesperado beijo.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Tolerância

O artigo que pousava sobre meu colo, em minha leitura ordinária de domingo, falava sobre a tolerância de um anfíbio.

A salamandra possui um período de vida que pode alcançar 10 anos. Pelo menos é isso que pensavam até encontrar uma congelada por mais de 90 anos. O animal foi deixado em banho-maria em água fria e ao descongelar logo voltou a caminhar, provando assim uma enorme capacidade de resistência.

Esse animal não sai da minha cabeça. Ele esnoba de minhas fraquezas e ressacas. Como pode a porcaria de um anfíbio, que posso matar simplesmente por pisar em seu ventre jorrando para fora suas entranhas, sobreviver por longos 90 anos sem ao menos perceber o extraordinário deste ato?

Deixei o artigo de lado e fui arrumar meu quarto, minha estante e notar a displicência que olho as fotos de casamento, dos meus filhos, da vida que finjo ser a verdadeira. Olho para a mulher que estou apaixonado na rua, quando acompanhado de minha mulher e finjo que não sinto nada por ela. Quando nos encontramos, choro em seu colo pedindo um perdão que minha covardia sabe que não mereço.

Vivo a 10 anos uma encenação. Vivo congelado como a salamandra. É por isso que estava irritado esta manhã. Não por ela ter sobrevivido aos 10 anos, mas por saber que ela abriu os olhos e seguiu adiante.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Doando sangue

A publicidade cumpre o seu papel, ela tira a ociosidade de nossos ombros e nos permite correr até o hemocentro para doar sangue.

Uma senha para ficharem o seu nome, aniversário, endereço, telefone e te entregarem outra senha.

Então furam o seu dedo e pedem que vá para uma sala aguardar alguns instantes, enquanto você deve comer cincos biscoitos de maisena, um suco de maracujá e quatro copos de água independente de estar com sede ou não.

Logo a senha aparece e você entusiasmado vai para a sala indicada. Consultório três.

Uma salinha estranha, com uma mulher esquisita de óculos pequenos e falando sem parar no celular. Após discutir o que ela deseja comer no almoço com o Giraffas, olha para mim, tira minha pressão e avisa que devo almoçar antes de doar sangue.

Saio puto por ter perdido uma hora esperando, quando poderia estar comendo. Mas tudo bem, precisam de sangue, vamos em frente.

Volto do almoço, outra mulher diz que devo esperar 40 minutos para a digestão.

Começo finalmente a entender porque ninguém doa sangue. Eles não conseguem!

Passam os malditos 40 minutos, ligo no trabalho avisando que estou doando sangue. Todos acham um ato nobre e então sei que posso demorar mais um pouco, quando confesso que minha paciência já está no limite.

Então vem o questionário.

- Já fez alguma cirurgia?
- Não.
- Alguma doença como sífilis, AIDS, hepatite?
- Não.
- Você tem tatuagem? Há quanto tempo?
- Tenho a mais de cinco anos.
- Usa drogas?
- Uso.
- Aham...
- Só maconha.
- Sei...
- Quantas parceiras você teve em um ano?
- Em um ano?
- Aham.

Paro um pouco e fico pensando enquanto ela começa a fechar a pasta.

- Obrigada, você não pode doar sangue.
- Mas eu me cuidei.
- Obrigada.
- Peraê. Você nem quer saber quantas?
- Foram mais de duas?
- Foram.
- Não preciso saber. Muito obrigada.
- Mas vocês não fazem um exame. Não vão responder se eu tenho alguma doença ou algo assim quando me mandam o resultado?
- Faz o seguinte. Se você conseguir uma parceira fixa pelos próximos seis meses, volte que iremos receber seu sangue com prazer.

É isso mesmo meu povo. Estejam em forma, não usem drogas, cuidem do que forem comer, tenha uma boa pressão arterial e não sejam solteiros. Isso hoje em dia é considerado grupo de risco.

p.s: confesso que fiquei um pouco chateado, mas doem sangue gente. Isso é importante! Abraços.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Uma noite

Com a língua dormente de vinho e a cabeça leve, ele se permite deixar de lado todos os receios e descer sua calça em plena rua. Sentir o corpo arrepiado no entrar do seu pau, apenas perde para o segurar firme de suas mãos a árvore, que serve de ilusão de privacidade ao coito no meio da rua.

Deveria ser feito rápido, deveria ser discreto. Mas o tesão impede essas regras, apenas fodem como deveríamos foder sempre. Longo, forte, cheio de desejos e sem nenhum receio além do não deixar marcas nesse desespero momentâneo.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Coisas de internet

Durante essa semana tive o meu e-mail roubado.

Impressionante como as pessoas ficam perdidas e estressadas por conta dessas coisas. A maioria das pessoas que eu conheço ficaram apavoradas com esse drama de internet: Vão colar fotos suas posando de pedófilo, mandar mensagens incriminadoras, dizer que você é gay, que agride mulheres e todos esses blás, blás, blás.

Estaríamos realmente tão escravos do virtual, onde sua palavra realmente vale menos do que é lido pelas pessoas? Ninguém mais sabe realmente quem você é. E como experiência esse período foi realmente gratificante.

Orkut, Msn, Gtalk, Blog. Essas são as ferramentas do trocar entre as pessoas. Uma ferramenta poderosa, que deveria ser tratada com respeito e melhor encarada sobre sua influência sobre quem somos, para quem deixamos de ligar e quem deixamos de ver para simplesmente saber como se encontram.

A maioria das vezes, a solução de um problema escondido de um grande amigo está no desviar de seus olhos e não em três pontinhos.

Louvamos a internet e suas conseqüências. Um ambiente livre e escravo da síndrome Genovese.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Cabaré

Alfredo havia sumido de casa há quatro dias. Foi aquele desespero, a família buscando em hospitais, os amigos procurando entre seus contatos, a mulher nos bares e foi então que um amigo recebeu a ligação. Era Alfredo ligando de um Cabaré, estava pedindo que buscasse uma calça limpa e um livro que havia esquecido na mesa de cabeceira.

Todos os amigos se reuniram e foram correndo para o distinto lugar, pela manhã parecia mais uma loja de venda de móveis e cortinas. Limpo e com aspecto de filmes antigos, eram plumas, tecidos, porcelanas e um homem sentado em uma enorme cadeira de couro com o sorriso do tamanho do mundo acompanhado de uma bela garrafa de conhaque.

- Alfredo homem... O que está fazendo aqui? Estava todo mundo preocupado com você.

- Preocupado por quê?

- Porque você sumiu Alfredo! Ninguém sabia de você, pensamos até que estivesse morto.

- Mas que seja assim então. Estou morto e enterrado meus caros. Não esqueçam das flores quando vierem me visitar.

Uma senhora, daquelas enormes com seios saltando para fora do robe, entregou um prato com frios e pães na mesinha ao lado de Alfredo e então lhe deu um demorado beijo na boca a ponto de deixar rosa seu loiro bigode.

- Mas era só o que me faltava. – Disse um amigo mais próximo. – Quer dizer que vai deixar sua mulher e filhas de lado para ficar vadiando em um puteiro?

- Alto lá Damião! Por acaso chamo assim a casa aonde você vive?

- Como é?

- Cansei meu caro. Cansei da minha casa. Resolvi que a partir de hoje chamo este Cabaré de lar. Aqui eu tenho a alegria ao meu lado, música, bebida e serei eternamente cercado de mulheres e sempre entrarão outras ainda mais jovens.

Os amigos incrédulos tinham apenas um pensamento. Endoidara o pobre Alfredo.

- E digo mais. Ai de quem pensar em destratar qualquer uma das moças com quem divido minha vida.

- Alfredo, isso é um Cabaré meu caro. Lugar de mulher perdida e diversão para os que podem pagar. Por que diabos você vai viver aqui? Como vai pagar para viver aqui?

- Me aposento. Dou metade da grana para minha mulher cuidar das meninas e outra metade para as meninas cuidarem de mim.

Parecia realmente decidido, entre o olhar dos amigos havia agora um misto de pena e inveja descarada. Eles apenas saiam calmamente, um ao lado do outro se convencendo a partir no balançar de suas cabeças.

- Pobre Alfredo...

terça-feira, 8 de julho de 2008

Uma mulher morreu no ônibus hoje pela manhã

Ela tinha 62 anos, era natural de Sergipe e seu nome era Dolores de Alcântara. Essas foram as informações deixadas em sua carteira, além de uma caixa de remédio para a pressão, papéis de sonho de valsa (exatamente quatro todos dobrados), uma conta de telefone de 84 reais e um caderninho com pequenos textos anotados a cada página.

Ela estava do meu lado e pediu para segurar meus livros enquanto estava em pé esperando espaço para passar a catraca. Em meio a um suspiro ela segurou o meu braço e pousou a mão sobre o peito, ela olhou para a janela e então morreu. Senti sua mão afrouxando enquanto algumas pessoas olhavam para mim e para ela.

- Motorista, pára o ônibus pelo amor de Deus!
- Minha nossa senhora.
- Hospital agora.
- Delegacia.

As pessoas gritavam sobre várias coisas e eu sabia que ela já estava morta. Poderíamos sair correndo para o hospital ou qualquer outro lugar, mas essa senhora já não estava ali realmente. Quem quer que fosse, quem amou, quem fez feliz e quais foram seus sonhos não estavam mais ali para comentar ou dizer nada. Nada além da educada forma que pediu para segurar meus livros que agora pousavam no chão do ônibus.

Todos estavam se afastando dela quando peguei sua bolsa e procurei saber quem era. Existia seu nome e uma conta de telefone com um número, seria o dela?

- Alô. Bom dia.
- Bom dia.
- Por acaso é da casa da senhora Dolores?
- É sim. Quem fala?
- Eu estou no ônibus que ela está...
- Meu Deus... Minha mãe. Minha mãe está bem? O que aconteceu?
- Ela passou mal no ônibus. Estamos indo para o hospital com ela.
- Que hospital?

Meus créditos acabaram. Não deu tempo de perguntar ao motorista e alguém ouviu apenas as palavras de um estranho que tentava conversar com calma e criando uma pequena mentira para uma pessoa aflita do outro lado da linha.

- Alguém tem créditos?
- Liga a cobrar.

O telefone não aceitava ligação a cobrar e parece que todos não tinham créditos, ou não queriam gastar os seus para tranqüilizar um estranho com mentiras sobre a sua mãe morta.

Fiquei ao lado dela, arrumei suas coisas e peguei os meus livros que estavam no chão. Em seu caderno tinha palavras cuidadosamente desenhadas, com uma pequena lista de compras, marcado de vermelho com um desenho de estrelas itens que tenho para mim, ser importantes:

Estrela – Caderno de 50 páginas
Estrela – Uma caixa de Bis
Estrela – Cadarços novos de cor branca

Um caderno, chocolate e cadarços brancos. Queria poder perguntar o porque esses itens são importantes Dona Dolores uma pena que estamos chegando ao hospital.

- Alô.
- Minha mãe está bem?
- Acabamos de entrar com ela no Hospital de Base.
- Como ela está?
- Ela estava desacordada quando chegamos com ela.
- Minha mãe tem pressão alta. Ela toma remédios.
- Qual é seu nome?
- Camilo.
- Camilo, por acaso você sabe o por que ela iria comprar um caderno, chocolates e cadarços novos?

Um adulto começou a chorar no telefone antes de desligar.

Uma senhora morreu no ônibus hoje e por algum motivo me sinto triste. Quero muito ver minha avó.

sábado, 5 de julho de 2008

Casamento

- E aê? Como foi o final de semana?
- Fui a um enterro.
- Enterro?
- Ou casamento. Dá no mesmo.
- Mas que cara mais amargurado.
- Nada, na verdade eu estou bem.
- Então por que da aversão ao casório?
- Odeio essas tradições, essas pompas e rituais. Por que gastar uma fortuna se arrumando, recebendo quem nem conhece e se fantasiar de princesa? Acho que vou proibir minha filha de ter bonecas.
- Facista.
- Facista o cacete! Por que não chamar os amigos, fazer uma festa e simplesmente se mudar?
- Porque para eles deve existir algum significado.
- Volto a repetir. Bonecas na infância.
- Ok. Isso quer dizer que você nunca se casaria?
- Nunca.
- E desde quando se tornou tão descrente?
- No dia que ouvi que teríamos filhos lindos.
- Hã?
- Estava no olhar dela. Nunca teríamos.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Fascinado


Quero esse desfoque de olhar
A leveza de teus traços,
E esse entender do apaixonar
Pela foto mais do que a fotografada.

foto de: Natasja Fourie

Carmem

Conheci Carmem em um aeroporto a caminho do Chile. Estávamos os dois no portão de embarque, quando vi todos os vôos mudando seus horários para o vermelho escrito atrasados. Mais uma crise no nosso sistema aéreo que iria possivelmente me fazer perder uma reunião de negócios que iria unir empresas em um acordo de 70 mil reais mensais.

Estava junto com uma massa de pessoas em um guichê, enquanto uma jovem de gravatinha azul pedia desculpas em um som monótono e pausado. Saí com minha gravata um pouco mais aberta e com o terno jogado sobre minha mala. Foi o tempo de massagear meus cabelos e esfregar meus olhos que notei seu sorriso em minha direção.

Por mais bonita que essa mulher fosse, seu sorriso me irritou mais do que eu já me encontrava irritado. Algo em seu desdém sobre minhas obrigações, como se uma mulher que estava portando apenas um caderno, um livro e uma pequena mala (possivelmente para férias) pudesse entender sobre viagens de negócios.

- Posso saber do que você está rindo?

- De seu desespero. É apenas um atraso.

- Não, não é apenas a porra de um atraso. Preciso estar em Santiago no horário previsto para uma reunião importante e se me atrasar demais irei perder um importante acordo entre empresas.

- A imagino que iria ganhar muito dinheiro com essa empresa.

- Bastante.

Então ela se levantou e veio em minha direção com seu livro. Ao abrir, possuía uma foto de uma praça aonde podia ver uma linda jovem olhando uma árvore.

- Essa é minha mãe. Ela tirou essa foto em 64 quando estava exilada.

- Bonita foto.

Estou mais uma vez olhando para o celular, olho para o guichê, volto meu olhar para o painel em vermelho e sinto sua mão sobre a minha.

- Ela tinha 19 anos nessa foto e disse que foi tirada pelo maior amor da vida dela.

- Então você vai para o Chile buscar o grande amor de sua vida. Sim, por isso você está calma. Esses tipos de besteiras podem esperar o tempo que for.

- Amor? Desde quando podemos esperar amor? E quem disse que isso é uma besteira?

- Pelo amor de Deus. Olha... Qual é seu nome?

- Carmem.

- Como a santa?

- Como a ópera.

- Então bucólica e romântica Carmem. Acredito que irá encontrar o seu grande amor no Chile. Você é uma mulher bonita, tem brilho no olhar e é jovem. Com certeza não terá problema algum em encontrar o amor. Só espero que quando chegar a Santiago, encontre uma pessoa que ganhe bem, por levar a sério o seu trabalho e possa cuidar muito bem de você.

- Qual é o seu nome?

- Hugo Parentes.

- Hugo, vou tomar um café com conhaque. Acredito que ficar nervoso não irá adiantar os vôos, gostaria de tomar um café comigo?

- Para quê?

- Acredito que possa te salvar com duas xícaras.

- Você está dando em cima de mim é isso? Me cantando quando estou esperando um vôo importante e estressado?

- Não senhor Parentes. Estava dando em cima de você quando estava olhando para ti enquanto ia até o guichê. Normalmente vocês homens não percebem esses sinais.

Ela me beijou com calma e de uma forma tão doce e apaixonada que não me importei mais com a viagem, com o atraso ou a reunião.

Cinco horas depois estávamos sentados em uma praça tirando fotos enquanto um celular insistia em tocar em meu paletó.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Infância

Uma amiga me lançou o desafio.

- Escreva alguma coisa sobre a infância.

Lendo o texto da mesma, leiam aqui, fiquei um pouco intimidado em escrever sobre nosso receio de crescer. Como o tema estava tão bem defendido dentro desta síndrome de Peter Pan viceralmente retratada, tentarei dizer o mesmo com a inevitável comparação entre essas linhas já ditas um dia.

Um dia destes eu tive um sonho.

Era um sonho bem bacaninha sabe? Um sonho sobre coisas esquecidas e bastante coloridas. Será que você vai ler sobre ele? Tanto faz! Escreverei assim mesmo.

Sonhei com um mundo cheio de cores e onde nada tinha a menor lógica e funções, um mundo cercado de árvores enormes e cheias de cipós, onde poderia se pendurar, balançar e escalar como quisesse.

Pequenas criaturas caminhavam como animais, outras voavam e algumas eram tão belas e perfeitas que pareciam estátuas. E que susto levei quando seu olhar de repente estava voltado ao meu e num pequeno e belo sorriso, piscou e voou. Sim! Voou!

Asas como dos insetos e mesmo não sendo borboletas eram lindas asas, translúcidas e frágeis, mas que mesmo assim levantavam seus corpos até o mais alto topo daquelas árvores.

Eles estavam em minha volta e me ofereceram bebidas e comidas maravilhosas. Comi um prato que tinha gosto de azul... Imagine só! De azul! E quando bebia suas bebidas não era bêbado que eu ficava, e sim cada vez mais sóbrio.

"Cuidado!" Eles me disseram. "Quanto mais você beber, mais vai entender quem você é."

Dancei e pulei. Brinquei e chorei! Que mundo lindo e tão misterioso é este que eu estava. E no meio de um beijo, eu acabei de acordar. Coberto de suor e lágrimas nos olhos. Sentindo pouco a pouco o cheiro daquele lugar sumindo de minha memória.

Então me vi acordado e pensei:

"Um bom sonho, um sonho bacana. Mas tenho que me arrumar e ir para o trabalho."

Senti algo gritando bem baixinho e sofrendo. Como se estivesse apunhalado alguém com uma faca bem afiada. Não... Não era uma fada que eu matava com minha descrença. Era o menino dentro de mim que morria em nome do adulto que está vindo a tona, que paga suas contas e que esquece que precisa de sonhos para viver.

E sabe? Pensei na única pessoa que vive aqui sem jamais acreditar que este mundo é realmente real. Você maravilhoso leitor! Pois eu e você sabemos.

Este mundo é real para os tolos. Não para nós, não é mesmo? Isso que você está lendo não é um texto em um computador. É uma folha antiga e bem velha com cheiro de tinta bem fresca. Pode sentir o cheiro? Eu consigo! É só chegar bem perto. Sem se importar com quem está perto de você, aproxime-se da tela e cheire! Humm... Pode sentir? Maravilhoso não!