segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Conversa de bar IX

- Nego deveria saber receber bem os amigos em sua casa e principalmente lembrar o quanto as pessoas eram pacientes com elas.

- Não acho que seja uma questão de falta de hospitalidade ou paciência. Tem haver com ritmos de vidas né?

- Mané ritmo de vida o quê? Isso é coisa de mulher metendo o bedelho. Nego tem que lembrar do quanto nego segurou a onda no passado, tem mais é que saber receber os amigos. Aguentar a segurar o perrengues dos demais.

- No passado você não cuidava de uma casa inteira. Não estamos falando da porcaria de um quarto e sim sobre cuidar da sua casa. São os móveis que você escolheu comprar, sua rotina de limpeza, as louças e roupas que o casal escolheu como organizar. Foi mal... é muita falta de noção achar que uma vida de zona organizada pelos demais deva persistir em nome de uma memória estagnada dentro de uma desculpa de amizade.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Valéria ano 94 - Parte Final

Já estou em Cuiabá a aproximadamente três meses. As aulas começaram em um ritmo bem mais tranquilo do que estava acostumado e o corpo docente foi bem cordial, fizeram questão de me fazerem sentir em casa.

Graças aos contatos de Valéria estava bem localizado em um apartamento bonito a menos de 10 minutos da escola em meio a Goiabeiras, bairro bem bacana e coincidentemente próximo a rua da coordenadora. Após um tempo indo a bares, conversando e trabalhando juntos percebi que não tínhamos nenhuma relação real fora do trabalho. Apenas as constantes estacionadas que sempre terminavam do mesmo modo sem qualquer alteração na rotina.

As vezes eu tentava acariciá-la, outras comentar sobre o assunto, levar o ato para uma sequência em minha casa, motel ou na casa dela. Todas essas tentativas fatalmente em vão. Todas eram sumariamente cortadas ou ignoradas como se jamais tivesse existido nada além de uma carona entre colegas. O fellatio era um assunto não comentado, um pormenor que nunca saiu daquele carro estacionado e jamais foi tratado como preliminar.

- Bom dia Diego.
- Olá Liz.
- Você está com uma cara de quem não dormiu nada. Está preocupado com alguma coisa?
- Liz deixa eu conversar com você um instante.

Fui caminhando até próximo do carro e falando baixo.

- A quanto tempo você conhece a Valéria?
- Creio que uns cinco anos.
- Ela sai com alguém? Foi casada ou algo do gênero?

Imediatamente Liz soltou um sorriso estranho.

- Ah... Não sei Diego. Talvez fosse melhor você perguntar diretamente para ela. Nunca vi Valéria saindo com muitas pessoas e não é muito cortês de minha parte falar sobre a vida de uma colega de trabalho. Ainda mais nossa coordenadora.

Segurei ela pelo braço antes que saísse.

- Espera.
- Ai meu braço!
- Desculpe-me... É que eu realmente preciso saber o que está... Foi mal Liz. Acho que eu estou estressado com as provas. Desculpe.

As pessoas começavam a comentar sobre mim nas conversas entre corredores. Pelo menos imagino que seja sobre mim. A maioria simplesmente se calava quando me aproximava e nunca mais me chamaram para nenhum happy-hour ou eventos que não fossem da escola.

Os encontros com Valéria continuavam do mesmo modo. Tentava aos poucos evitar suas caronas mas era em vão. A maioria das vezes tínhamos que sair com a desculpa de comprar equipamentos, materiais, buscar alguém, uma reunião... Todas essas tarefas eram deixadas de lado enquanto nos dirigíamos a Ponte Nova e sempre com a mesma finalidade.

Fui tentando impedir esse ato que para mim já era uma escravidão sem propósito. Não entendia mais como reagir. Parecia que do mesmo modo que não conseguia nenhuma expressão do rosto de Valéria não conseguia negar ser mecanicamente chupado. Algumas vezes simplesmente implorava para que fosse rápido, outras pensava em algumas mulheres com quem já tinha saído e muitas vezes apenas chorava sussurrando para que parasse ou que me explicasse o motivo.

Todas as vezes que tentei dormir com outra mulher havia se tornado em um martírio. Era como se meu pau só levantasse ao comando de Valéria. Como um animal de circo que havia sido condicionado a ficar excitado apenas na curva da Rua da Expedição. Qualquer outra tentativa era como um morto deitado sobre aulas de anatomia.

- Preciso pedir minhas contas.

Ela me encarou como qualquer coordenadora já olhou para mim quando pensei em mudar de escola ou quando achava que os valores não eram do meu agrado.

- Certo professor Diego. Vou preparar seus documentos e encaminhar ao RH. Espero que fique conosco até o fechar do Semestre, seria mais profissional de sua parte para com a equipe e obviamente com os pais e seus alunos.

Acabei perdendo minha cabeça e joguei uma pilha de livros no chão enquanto apoiava com força minhas mãos a mesa e a encarava com um nítido ódio crescente no olhar.

- Qual é a sua?! Sua vagabunda!
- Perdão?
- Você está de sacanagem com a minha cara ou que?! Qual é a merda do seu jogo caralho!

Nessa hora as pessoas começaram a se reunir em frente a sala, tenho certeza que alguns alunos também mas eu não me importava mais com nada.

- Você tem me chupado na porcaria daquele cantinho nojento ao lado do rio desde que cheguei aqui e não se importa com mais nada? Você é feita de gelo ou algo do tipo?! Tenho tentado entender o que você quer, o que é isso que nós temos e por que diabos você me escolheu. Fico pensando por um momento, talvez um maldito momento, que você se importa mas parece que ao pedir demissão você não está nem aí! O que você vai fazer? Contratar outro idiota para ficar boquetando no seu maldito carro?

Lembro do Thomas, que era um professor bem forte de educação física e o Bedéu da ecola o Antônio me arrastando para fora da sala. Eles primeiro tentaram conversar comigo, depois me lembro de tentar reagir e finalmente me deram uma surra.

Depois de algumas horas de dúvida se deveriam ou não chamar a polícia me lembro da corajosa Valéria dizendo que me levaria ao médico, lembro de algumas pessoas aconselhando que outra pessoa me levasse, que pelo menos alguém nos acompanhasse, lembro até do Thomas me encarando de forma ameaçadora deixando claro que iria me quebrar em dois se eu tentasse alguma coisa.

Lembro do carro seguindo pela cidade a pouco menos de 50 por hora. Lembro do silêncio aos meus pedidos de desculpas, de meu rosto inchado olhando para o retrovisor e do dente quase solto. Lembro de um ritmo hipnótico e agonizante que me fez chorar em prantos enquanto virávamos pela conhecida esquina da Ponte Velha.

Valéria ano 94 - Parte 2

O telefone toca e levanto em um pulo.

- Alô?!
- Senhor Diego?
- Hã? O que foi?
- Desculpe interrompê-lo. É uma ligação para o senhor. Posso completar?

Quem diabos era?

- Aham. Claro.

Olho para o relógio e são umas 22h30 devo ter apagado por umas seis horas.

- Alô Professor Diego estava dormindo?
- Quem está falando?
- A Valéria do colégio.
- Ah, sim... Desculpe não estava esperando nenhuma ligação.
- Peguei o número do seu quarto na recepção. Só queria saber se gostaria de conhecer algum dos professores. Estamos saindo hoje para o Club Garage é uma boate perto da Avenida Beira Rio.
- Hã?
- Nós passamos perto de lá quando estávamos indo ao restaurante.
- Ah tá certo. Bem, não sei direito eu meio que acabei de acordar.
- Perfeito. É o tempo de você tomar um banho enquanto eu saio de casa. Passo aí para te buscar ok? Até.

Ela desliga e vou olhar minha cara ao espelho. Percebo que a maioria das minhas roupas estão tão amarrotadas quanto minha cara. Tomo um banho quente e faço minha barba. Visto-me com o que parece menos visivelmente amarrotado e então encontro Valéria e duas amigas em frente ao hotel.

- Essa é a Liz e a Fernanda. Esse é nosso novo professor o Diego.
- Prazer.

As duas são bem mais novas e abrem espaço para que eu fique no banco da frente. Ao levantar noto que Fernanda, que se encontrava no banco da frente, está cheirando a álcool e cambaleia rindo para o banco de trás.

- O Diego veio de Brasília.
- Sério? Você já encontrou o Itamar em algum lugar?
- Parece surreal, mas nunca encontrei com ele.
- Não passeia nem pelos colégios?
- A maioria dos presidentes não passeiam por colégios particulares.
- Isso vai mudar quando o Lula ganhar.
- Tomara.

Chegamos a uma boate que pelo que imagino a maior parte do público é repleto de adolescentes. Elas comentam algo sobre a bebida ser mais barata do que a tal Lotús, que depois de um tempo finalmente entendo que se trata de outra boate.

- Não vai para a pista?
- Ele é de Brasília Liz, não dança.
- Mais cerveja?

Depois de doze cervejas já estou tonto e querendo ir ao banheiro. Cambaleio entre as pessoas e tento ficar reto enquanto mijo. Não tenho como evitar rir quando percebo que estou mijando no meu sapato.

- Você está bem?
- Bebeu demais né?
- Porra fazia tempo que não bebia tanto sem comer nada. Tá me lembrando a faculdade.
- Toma mais um gole. Pior você não fica.

Depois de um tempo lembro de entrar no carro e seguir até perto do rio onde Valéria para com o carro. Comento alguma coisa sobre as professoras e quando vou perguntar se ela vai me deixar em casa recebo outro boquete. Dessa vez mais demorado e quando tento acariciar sua cabeça ela simplesmente tira minha mão.

Acordo no hotel tentando entender exatamente como cheguei aqui, com a cabeça doendo e tentando acreditar no dia que tive ontem.

continua...

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Valéria ano 94 - Parte 1

Quando desci do avião em Mato Grosso no ano de 94 para lecionar em uma nova escola fiquei perdido por alguns instantes no aeroporto tentando encontrar alguma placa que dissesse meu nome ou a mulher de vestido azul que iria me buscar. Engraçado o quanto damos atenção à quantidade de mulheres que usam vestidos azuis enquando esperamos desconhecidos.

Fiquei aproximadamente uns trinta minutos sentado em cima de minha mala com um refrigerante de cola na mão enquanto encarava uma mulher em seus trinta e muitos, talvez entrando nos quarentas sentada de pernas cruzadas olhando para o nada. Depois de uns três minutos resolvi arriscar.

- Valéria?
- Pois não?
- Você é a Valéria?
- Sou sim.
- Ah... Sou o Diego. Vim de Brasília. Sou o professor contratado para a Escola Vale Verde.
- Ah sim! Prazer Diego. Sou Valéria a coordenadora da escola. Chegou há muito tempo?
- Um tempinho. Não sabia que tinha tantas pessoas de vestido azul por aqui.

Ela não sorriu e então achei melhor só segui-la para dentro do carro.

- As aulas começam em março?
- Isso. Você vai gostar da turma são bem tranquilos. Primeira vez em Cuiabá?
- Sim. Li bastante a respeito mas nunca tinha visitado. Quero muito conhecer o Palácio da Instrução. Dizem que é bem bonito a noite.
- É sim. Você vai ter bastante tempo para conhecer.

Passamos mais um tempo em silêncio onde fiquei notando a paisagem e tentando evitar olhar as pernas morenas no vestido que teimava subir em tempo em tempo durante o percurso do aeroporto.

- Quanto tempo até a cidade?
- Como vamos pela Ponte Nova você vai ter a chance de conhece melhor o rio. Devemos chegar em uns 20 minutos no máximo. Imagino que gostaria de comer alguma coisa antes certo?
- Agradeceria. O que você sugere?
- Tem um self-service perto da Praça Antônio Corrêa. Acho que você vai gostar.
- Perfeito.

Quando vamos entrando perto da cidade ela passou rente a ponte e então virou a esquerda. Notei que procurava algum lugar para estacionar, provavelmente por conta da cheia do rio, tínhamos uma linda visão de uma queda d’água mas confesso que com a fome que estava esperava que esse simpático tour durasse apenas dois minutos. Por que afinal de contas ela comentou sobre o restaurante então?

Quando o carro parou. Fui abrindo a janela quando senti as mãos de Valéria sobre o meu pau. Ela abriu meu zíper e ato contínuo me chupou ali mesmo ao som da cachoeira e um calor surreal que atraíra mosquitos para dentro do carro. Terminado o ato ela voltou ao volante e foi dirigindo até o restaurante em silêncio.

Comemos uma moqueca com uma combinação bizarra de batata fritas e salada de alface com tomate. Dividimos uma cerveja e então ela voltou a falar.

- A turma que você vai lecionar é a 5°B e a 8°A. São em sua maioria filhos de gente rica e mimada de Cuiabá. Então é melhor saber qual é sua posição na sala de aula. Se você titubear eles vão montar em você.
- Tenho experiência com crianças mimadas. Dei aula em alguns colégios particulares de Brasília. Dois dos meus alunos eram filhos de políticos.
- Políticos... Há! Você vai entender o que são filhos de poderosos por aqui.

Terminamos a cerveja e ela me deixou em meu hotel. Perguntou mais alguma coisa sobre eu ter ou não um lugar para ficar, quanto eu estava pensando em gastar para aluguel e se tinha gostado do restaurante terminada a conversa me deu um beijo no rosto e partiu.

Fiquei pensando enquanto desfazia minha mala sobre o que diabos tinha acontecido. Era realmente uma espécie de batismo, apoio ao companheiro de trabalho, cantada, talvez cultural? Estava começando a bancar o preconceituoso e idiota. A chupada tinha sido tão banal quanto um aperto de mãos, nada demais e sem qualquer afeto ou comentários após feito. Resolvi tomar uma ducha e dormir um pouco antes de conhecer a cidade.

continua...