terça-feira, 29 de abril de 2008

Pornografia

- Encontrei em meio às revistas... Estava lá, dentro de uma caixa, são vários DVDs!

- Calma Carolina. Exatamente sobre o que são esses filmes?

- Como assim? São vídeos pornográficos Amanda! Dentro da minha casa!

Eram apenas duas da tarde quando Carolina encontrou a caixa secreta de Arnaldo, ela estava arrumando sua estante de troféus do segundo grau e percebeu uma caixa que nunca tinha notado antes, cheia de DVDs pornôs.

- Mas qual é o problema afinal?

- O problema que isso aqui é uma casa de respeito Amanda. Tenho duas filhas, uma de 14 e outra de 17 anos. O que você acha que elas iriam pensar do pai delas ao encontrar essa caixa de coisas sujas?

O fato, é que na verdade as meninas nem ligariam. A mais nova passava a maior parte do tempo acessando a internet e deixando sua imaginação correr solta em sites abertos de pornografia e a mais velha... Bom, talvez uns dos filmes da internet fosse dela mesma como atriz.

- As meninas são grandinhas. E hoje em dia todo mundo sabe que isso existe Carol. O Arnaldo é um excelente marido, não acha que está exagerando?

- São mais de 18 anos de casados e nunca imaginei tamanho disparate. Para que ele precisa dessas coisas?

- São DVDs ou VHS?

- Hã? São DVDs por quê?

- Menos mal querida... Se fosse VHS seria praticamente uma coleção de antiguidades, se são DVDs são recentes. Talvez seja uma fantasia do momento.

- Me recuso a continuar deitando na mesma cama com um homem que veja pornografias. Isso é um absurdo!

- Olha, poderia ser muito pior. São apenas filmes. Ele poderia estar te traindo com uma menina mais nova.

- Mais é traição do mesmo jeito. Uma traição contra Deus!

Carolina havia se convertido há uns quatro anos. Ainda era uma mulher atraente em seus 44 anos e mantinha a forma por conta da academia e caminhadas no parque da cidade. Mas desde que entrou na igreja Deus tem sido seu melhor companheiro.

- Porra Carol... Por isso que o Arnaldo está vendo pornografia. Qual foi a última vez que você deu o cú para seu marido?

- Escute aqui Amanda. Você é minha amiga, mas não é porque você vive uma vida desregrada de solteira, que devo dizer que é uma vergonha para uma mulher da sua idade, que pode falar essas perversões sobre minha vida pessoal.

- Vai tomar no meio do seu cú Carolina! Liga para a porra, do corno, do seu pastor ao invés de mim na próxima vez! Caralho!

Amanda era uma mulher que foi casada o suficiente para saber quanto tempo deve se dividir a cama com um homem ao invés de uma casa. Ela se separou como a maioria de suas amigas, mas nunca quis ter filhos e viver de pensão. É uma profissional de fibra que adora o que faz e ir ao Beirute com suas amigas após o trabalho. Ainda em seus 38 anos, atrai mais homens do que realmente precisa. O que sempre deixa claro que a cansa.

- Alô? Desculpa Amanda... Você é a única pessoa que eu posso falar sobre isso. Prefiro morrer ao contar para o grupo da igreja.

- Tudo bem Carolina. Olha, ele chega que horas?

- Hoje ele vai para a academia, deve estar chegando umas 19:40 ou 20 horas.

- Tudo bem. Pede para as meninas irem para casa de uns amigos, vai para o shopping, compra uma lingerie bonita, uma coisa fácil de comer mais tarde e assiste os filmes enquanto seu marido não chega.

- O quê?

- Você quer salvar a porra do seu casamento ou não?

- ...

- Vai assistindo e tenta se lembrar o que você fazia quando era uma adolescente. Lembra das vezes que ficamos com o Rodrigo na casa dos pais dele no Lago Sul?

- Não acredito que você está falando isso.

- Se eu me lembre, você ficou rouca alguns dias por conta do tamanho do pau dele não foi?

- Meu Deus...

- Assiste a porra do filme e come seu marido mulher. Está dentro da sua casa. Isso deve ser liberado por Deus pelo menos.

Arnaldo chegou por volta das 19:50, pontual como um relógio, o serviço estava estressante e ele agradecia pela academia por deixá-lo um pouco mais relaxado para o dia seguinte. Entrando percebeu que as meninas não estavam e tão pouco a mesa estava posta, havia um bilhete sobre ela.

“Venha para o quarto.”

Entrando em seu quarto, ainda desconfiado, viu sua mulher vestida com uma lingerie branca toda transparente, com uma linda meia calça e um olhar sacana voltado para a televisão onde estava passando um filme de sacanagem.

Carolina parecia fora de si, mexia freneticamente em sua boceta em um delírio sem tamanho. Gozava como há muitos anos não gozava.

- Porra Carolina! Mas que merda é essa?!

Arnaldo se divorciou de sua mulher em menos de duas semanas. O juiz aceitou o divórcio sem pensão para mulher, pois o marido disse que ficaria com as meninas para afastar delas a degenerada que a mãe era.

Logicamente a filha mais velha (Tatiana era seu nome) jamais confessou que a caixa pertencia a ela e continuou sua coleção na casa do seu namorado.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Correspondência

- Chegou uma carta para você.

A garota que acaba de voltar de seu estágio deixa a bolsa no sofá e segura a carta com uma nítida desconfiança. Nunca recebera uma carta, além de boletos e cartão enviados, e com ela em mãos apenas tentava desviar o olhar curioso de sua empregada.

- Acho cartas tão românticas. Que sorte você tem menina.

- Obrigada Adelaide. Não ponha meu prato, vou comer mais tarde.

Deixando sua pasta na escrivaninha, ela tira seu tênis e senta em sua cama com sua correspondência em mãos. Nela tinha escrito apenas seu nome e como remetente as iniciais J.I.

Clarice,

escrever esta carta é uma confissão de culpa escrita a punho. A necessidade de dizer o que me incomoda a meses, dispersa minha integridade e que precisa deixar provas que possa me por sobre julgamento de quem prezo.

Estou traindo meu melhor amigo ao que penso em relação a ti. Tudo o que construí em 13 anos de caminhada baseada em respeito, confiança e apoio foi destruído ao mirar de meus olhos e o tocar de suas mãos.

Estou apaixonado por você. Não posso deixar de dizer o que me consome e me tira o sono. Quero o sorriso voltado a mim ao invés do Hugo. Quero o toque de suas mãos e o cheiro próximo de sua pele. Quero que seja meu motivo de viver, além das Musas que me fazem escrever estas linhas.

Não tenho medo te de olhar nos olhos e repetir pessoalmente o que derramo nesta folha. Apenas assim fiz, para que mostre ao meu irmão a nota de confissão do estremecer de minhas ideologias, pelo sabor de um sonho ao seu lado.

Por favor, recuse minhas palavras e me afaste do círculo que traí, no momento que dançamos juntos sem ouvir nenhuma música além do tom de sua voz ao sorrir e no flerte imaginário que vi em seus olhos.

Sei que percebeu, ao nos despedimos, quem te escreve essa carta. As iniciais não foram para me acobertar, apenas busquei um nome que estive a altura de minha traição.

p.s: me desculpo pelas linhas exageradas e ridículas.

Judas Iscariote

Mãos trêmulas alcançam o telefone as três da manhã, uma voz de choro e lágrimas dizem algo incompreensível a princípio.

- Clarice? Alô! O que foi amor? Clarice!

- Por quê nunca me escreveu uma carta?

- O quê?

Ela desliga o celular e chorando beija a carta amassada em suas mãos, selando-a com um beijo.

- Meu amor...

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Uísque

Minha menina pede uísque quando entramos nesse café. O garçom me encara por alguns instantes aguardando meu consentir.

Lógico que sim meu caro! Ela merece o valor do uísque. Sirva o quanto ela queira e me traga minha maldita cerveja.

- Caubói por favor. Gelo para mim, só em caipirinha no verão. Gosta de caipirinha?

O meu olhar de surpresa é calado pelo desdém do dela e o sorriso do garçom.

Ela me dá um beijo e pede licença para ir ao banheiro. O garçom me oferece um copo de uísque e ao recusar ele me serve assim mesmo.

- Vejo casais entrando e saindo dessas mesas a muitos anos. Esse olhar merece um uísque.

- Mas eu não bebo uísque.

- Acredite, jamais irá parar de beber após essa noite.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Corte

Na quinta série eu me lembro de uma menina parada debaixo de uma árvore agachada e olhando para suas mãos. Parecia como todas as outras meninas da escola, com o mesmo uniforme e um all star vermelho.

Estava olhando para ela quando me chamou.

- Você já se cortou alguma vez?

Ela pegou minha mão e me passou um estilete escolar, fiquei com o objeto em minha mão olhando para ela.

- Não dói. Na verdade machuca muito mais pensar no corte do que fazer.

Ela me mostrou sua mão cortada em um desenho sangrento, parecia estar escrito amor.

- Tem que doer para sentir que valeu a pena.

Ela passou o estilete em minha mão. O corte foi fundo e levei 14 pontos. A menina foi expulsa e nunca mais a vi. Mas ainda posso sentir sua mão macia embaixo da minha antes do corte e o sorriso ao ver minha cara de dor.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Família

Um homem carrega o peso do mundo nas costas. Ele está com medo de algo oculto que o consome sem dizer os meios. Ele está com medo por se sentir sozinho.

Ele é um completo idiota.

Em uma mesa os olhares mudam de medo, afeto, unidade e luta.

Aquele que ao seu lado tem irmãos, nunca está sozinho.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Boçalidades

Sem álcool há dois dias e nada de sexo por uma semana. O mundo começa parecer bem menos interessante mesmo. Parece que se torna ler e reler e-mails, assistir filmes que já estavam acumulando em sua estante, alguns livros sem concentração e seriados americanos comprados na feira do cruzeiro.

O médico deveria, ao menos, ter liberado o café para me fazer parar de bocejar na frente dos clientes nas reuniões. Mas o tédio é tamanho que prefiro vir com esse olhar de zumbi do que ficar em casa olhando para a televisão sem ao menos poder tocar uma punheta.

Beber socialmente realmente é o termo que me represente nesse exato momento. Todos os convites são para bares ou para vinhos acompanhados de música em suas casas. Uma prova que todos meus amigos são bêbados e todas as conquistam precisam de álcool como facilitador. O que não seria nada ruim, já que curto a companhia de meus amigos bêbados e meninas bonitas, que precisam beber um pouco para falar sacanagem ao pé do ouvido.

Agora contra o tédio a única fonte que me resta são os prováveis doces que irão me tornar diabético. Assim eu saio de um problema no coração, vou para um novo no estômago e em breve serão insulinas e a contratação urgente da Sky, sem o canal pornô por hora.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Colega de trabalho

Local de trabalho realmente é um local estranho e ímpar. Passamos mais tempo aqui, acordados, do que em qualquer outro local de nosso dia-a-dia. E de uma forma ou de outra passamos mais tempo com as pessoas que trabalham em nossa volta do que com nossos parentes e amigos. Algumas poucas e raras vezes, podemos ter nossos amigos trabalhando conosco. Mesmo que demoremos um pouquinho para perceber.

Lembro de uma menina entrando com o seu cabelo enrolado e um olhar meio tímido, essas pessoas que entram quando você está fora sabe? Nunca se sabe se será um filho da puta que vai roubar seu lugar, alguém que vai dar mais trabalho do que ajudar ou se será uma companheira de desenvolvimento de layouts, dores de cabeça, pontas soltas, sapos sem motivos e o desespero clássico do crescer profissional.

Os primeiro dias são as sondagens básicas não é mesmo? Sendo simpático, mostrando o que você sabe, aonde pisar e no final das contas acaba se tornando uma troca. As idéias dela são bem melhores e vocês trabalham melhores juntos do que qualquer outro poderia trabalhar na empresa.

Acabamos percebendo que estamos nos tornando amigo de alguém no trabalho, não quando você ouve seus problemas e saem juntos. Mas quando você brigam por alguma besteira e fica puto por mais de três dias e do nada estão se falando como se nada tivesse acontecido.

Tempo é uma ilusão. A velocidade dele sempre me incomodou e saber que a partir de hoje irei encontrar seu nome em verde no Gtalk sem poder olhar suas caretas ao meu lado machuca um pouco.

Acabaram-se as discussões sobre seu cabelo enrolado, finalmente ela descobriu que fica melhor assim, lógico que devemos agradecer ao amadurecimento, e não as minhas eternas críticas sobre ele liso.

Não verei mais o rosto agoniado com alguém vendo seus trabalhos por cima do ombro, muito menos poder ligar para comprar um miojo no caminho do trampo, discutir seus relacionamentos (sempre valeram a pena e sempre chorei de rir) e de por os meus a tapa para troca (espero ter valido de risadas também).

Belle é minha amiga sim. Esteve no meu aniversário aonde a maioria dos meus amigos furaram e consegui me sentir a vontade e a certeza que qualquer lugar é o lugar. Sendo diferente, ouvindo suas músicas horríveis e danças frenéticas ela é minha amiga. E terei que me obrigar a vê-la mais, assim como várias outras que foram saindo para novas etapas, felizmente não estágios (pegou a piada? Pegou?).

Um excelente caminho à frente e a certeza que deixa muito mais do que uma cadeira vazia, que demorou demais para ter. Já com saudades. Mesmo sem lágrimas.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Exames

Todas essas salas de espera de clínicas são iguais. Um bebedouro, cafezinhos aguados, revistas semanais que o bom senso te impede de ler, poltronas confortáveis e um quadro de algum artista anônimo de um shopping qualquer.

- O senhor pode entrar. O Dr. Rogério o aguarda na sala 3. Fica à esquerda.

Aonde eles encontram essas atendentes? Todas amáveis, bem vestidas e com um penteado que lembra tias, independente de que ela tenha 20 ou 40 anos. Na verdade, atendente de clínicas particulares são as únicas mulheres que não tem idade alguma.

- Bom dia. Por favor, senhor Mariano, sente-se.

Sua sala é como todas as outras de médicos. Absurdamente limpa, branca, uma caminha ou maca, alguns livros na estante, o clássico diploma na parede, mais um quadro ridículo e uma mesa estéril, sem vida e sem fotos.

- Gostou do quadro? Meu filho que fez.

Certo, não era de shopping, ponto para o médico. Peraí? Filho? Esse homem tem um filho e ainda por cima a coragem de admiti-lo a mim? O que mudou desde a última vez que estive aqui e era apenas Senhor Mariano e Doutor Rogério?

Ele mexe em sua pasta, me encara duas vezes e pergunta se estou me sentindo bem, se desejo um copa de água. Sim, lógico! Hoje sai os resultados dos exames.

- Bem... Encontramos uma pequena mancha em seu estômago. Mas ainda não sabemos exatamente o que é.

Uma mancha? Acredito que seja bem diferente de encontrar uma mancha em uma mesa. Que porra de informação é essa?

- Bem, ela deveria estar aí?

- É exatamente o que estamos tentando descobrir.

- Tentando descobrir?

- Na verdade iremos fazer mais alguns exames para termos certeza do que estamos enfrentando.

O restante da conversa eu não prestei muita atenção. O termo enfrentar me diz que é uma batalha e as possibilidades médicas em combater são sempre hediondas.

Enquanto ele falava, fiquei apenas lembrando dos três dias seguidos que estou vomitando e cagando sangue. Não gosto de médicos.

- Enquanto aguardamos os demais exames, seria melhor o senhor cortar a bebida, o cigarro, comidas gordurosas e o café.

Não... eu simplesmente odeio médicos.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Deus salve a Rainha

Abençoado seja o jovem Ben McBean, o herói, que receberá medalhas e talvez o cargo de Sir pela Rainha da Inglaterra. Ele perdeu seu braço e sua perna ao pisar em uma mina, na retirada das tropas inglesas, no Afeganistão.

O jovem soldado serviu ao seu propósito. Salvou seus companheiros do campo inimigo e alcançou o maior condecoração há um soldado de 21 anos. Ele pode voltar, de muletas, com uma medalha em seu peito e aclamado como herói pela própria família real inglesa.

Por acaso todos os soldados são agraciados pela própria família real, por serem mutilados em guerras que a Bretanha se envolva? Por acaso, o Príncipe Harry estava entre os soldados que se encontravam sobre fogo cruzado dos Talibãns. Um alvo enorme entre as tropas: loiro, jovem, nobre e herdeiro da coroa inglesa.

Mais uma vez, os que sustentam a monarquia, entregam de corpo e alma seus interesses ao belo hino, bandeira e família. Deus salve a rainha!

"A todo inimigo latente,
e a todos os assassinos, afaste,
Deus salve a Rainha!
Sobre ela, estenda seu braço,
Pela causa britânica, defenda,
Nossa mãe, príncipe(princesa), e amigo(a),
Deus salve a Rainha!"

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Putrefará

Calor, tremer, latejar, suar e convalescer.

O corpo treme e as mãos buscam afastar as cobertas, ao mesmo instante que a puxa para si.

Sentir o seu organismo revirar por dentro te trás o refém que a mente é de seu corpo, nos pesadelos que antecedem o despertar, no tremer que faz suas mãos passarem correndo pelo corpo e o disparar a latrina e deixar que suas entranhas gritem por você.

O vômito é o degustar do prato e do vinho, que se torna calor em fel descendo pela privada.

Veja 10 minutos de uma homem indo e vindo ao banheiro, cronometre, e terá a certeza de como foi toda a sua madrugada.

O dia nasce e o que sobra na cama é um corpo suado e vencido por uma luta interna que ainda não pode se identificar. Que tirou sua noite e o levará exausto e amedrontado em busca de especialistas, que nada sabem, a princípio.

Os olhos vazios mostram que a alma existe de fato. Afinal, o que levaria esse corpo vazio e fraco andar e seguir adiante?

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Sol nascente

Eu odeio seu doce de feijão, como ela não suporta o arroz-doce.

Minha gueixa não se comove por nada do que digo em português e escondo o riso ao ouvir seu gozo em japonês.

Adoro os pratos exóticos de seu País e ela é uma viciada em fast-food. Desistimos dos jantares, mas não dispensamos o bom vinho.

Uma palestra e uma semana foram o quanto durou nossas flores de cerejeira.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Foco

- Queria deixar de sentir esse desejo por ti. Ele me nubla as idéias e não permite que ponha meus objetivos em foco.

- Uma vez me disse que seu objetivo era me levar para cama.

- Isso! Mostre cruelmente como que me reduzo em estar contigo.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Conversa de bar

Já são mais de dez cervas na conta e as meninas já saíram da mesa.

- O Batman é o melhor super herói que rola.

- Todo mundo paga pau do Batman, me amarro no cara, mas o Super Homem é um personagem massa.

- O Super Homem? Tú tá de brincadeira.

- Não cara, sério mesmo. O Super é massa! O problema são as histórias que fazem dele.

- Cara qual é a graça de um super herói que é invulnerável a tudo e sempre ganha?

- O Batman é a mesma coisa. Só que ninguém pára para pensar nisso. O cara sempre ganha, não importa de quem seja.

- Mas pelo menos sai com uma costela quebrada e nariz quebrado as vezes.

...

- Pensa no seguinte. Se o Super Homem existisse de verdade seria mais sinistro que o Batman.

- Lógico que não!

- Pensa só. Um assalto. O cara sai do banco...

- Com um saco de dinheiro? Isso só rola em quadrinhos.

- Porra sei lá. Por debaixo daquele túnel que nem rolou com o Banco Central então.

- Beleza.

- Aê tão passando pelo túnel e tem um vulto colorido, de capa vermelha, grande e bombado pode crer?

- Aham. Grande e bombado... Tá gostando de ir a academia né?

- E ele tá voando! Voando cara! Isso é muito sinistro.

- Tipo voando dentro do túnel? Tipo batendo a cabeça no teto, se sujando de terra?

- Porra! O cara tá voando beleza? O túnel é alto.

- E creio que iluminado e sem poeira para notarem o cara direito também.

- Foda-se! Tipo isso. Posso continuar?

- Manda aê.

- Aê os assaltantes descem tiro no cara. As balas ricoceteiam pela parede do túnel, vai que uma ou outra acerta um dos caras. Eles sentem as armas queimarem em suas mãos. Queimaduras sérias, de aço derretido. E então ele prende todo mundo em uma barra de ferro que pode quebrar até suas costelas, deixando eles respirando com dificuldades.

- Só...

- Muito mais sinistro que o Batman.

- Não acho não.

- Porra como assim...

- Dentro desse seu parâmetro bêbado e nerd de raciocínio, vamos ver o Batman tá? O cara não existe saca?

- Como assim não existe?

- O Batman não existe. É uma lenda urbana, as pessoas falam de bandidos, traficantes e assaltantes que são duramente espancados pelas ruas. Mas ninguém nunca o viu.

- Claro que viram, foram espancados por eles.

- Não meu velho. O Batman é um vulto que te taca no chão e destrói ossos. Quando você pensa em luta marcial contra um grupo de pessoas, você não perde tempo batendo de leve em todo mundo. Você acerta um golpe muito forte para desnortear as pessoas, para ter tempo de bater em todos.

- ...

- E o Batman é fascista. Ele faz lei com as próprias mãos. Não acredita em direitos humanos. Ele espanca querendo matar, mas não faz isso porque é bichinha.

- O Batman é bichinha?

- Porra até parece que você não conhece nenhum gay. Traumatizado, cuidado por um velho mordomo inglês, malhado, bonitão, milhonário, playboy, veste colan, solteiro e vive com um menino de sunga ao seu lado. Viadão.

- Viadão responsa.

- E mais casca grossa que o Super.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Tia Regina

De todas as mulheres de minha família, a que eu mais me fascinava era uma senhora a quem todos chamavam de Tia Regina. Ela odiava que a chamem de tia, e sempre nos corrigia, em meio a seu praguejar, que não a chamassem assim.

Ninguém jamais soube exatamente a idade dela. Alguns chutariam uns 70 outros quase 80 mas a educação e intimação dos mais velhos nos impediu saber sua verdadeira idade.

Sabemos que ela foi uma mulher muito bonita, a mais bonita de todas da família. Quando mostrava suas fotos antigas, coisa que adorava fazer, sempre víamos uma linda mulher, com a aparência das antigas divas do cinema americano. Loira de cabelo prata, olhos vivos e brilhantes, com uma pele bonita e sempre bem vestida, nunca a vi sorrindo em nenhuma foto.

Ela foi escondida para a Itália na segunda guerra mundial, tinha 15 ou 16 anos e serviu como voluntária numa enfermaria. Alguns dizem que ela fugiu porque estava grávida, ela me contou que queria apenas embarcar em uma aventura. E dizia sorrindo que os italianos eram lindos de doer.

Gostava do modo como ela fumava um daqueles seus cigarros finos, em piteiras antigas de marfim, já amarelado e manchando. Sempre acompanhado de um copo comprido preenchido de seu Campari. Minha mãe diz que é bebida de antigas meretrizes. Minha tia dizia que meretriz é a mulher que se casa sem amor.

Ela sempre ouvia música em um quartinho separado em um canto de sua casa. Lá ninguém podia entrar e diversas vezes, eu ficava sentado na beirada da porta, escondido, ouvindo suas cantoras de voz suave e línguas estrangeiras.

Um dia ela me chamou enquanto ouvia música. Primeiro corri assustado e então ouvi ela me chamando baixinho, dizendo que era para eu sentar com ela e ouvir de dentro.

Me colocou em seu colo e ficamos ouvindo um bom tempo as músicas tocadas pela agulha. Ela tinha um sorriso no rosto e me pediu para eu abrir uma gaveta, que se encontrava numa escrivaninha velha, eu tinha 8 anos, aonde tinha uma foto antiga e em preto e branco de um piloto. Ele era muito bonito.

“Esse meu filho é o único homem que eu amei.”

Ficamos ouvindo o disco até o fim e com a foto em nossas mãos. Então ela me abraçou com força e tocou meu cabelo enquanto beijava meu rosto.

“Nunca peça uma mulher em casamento. Faça que ela jamais se case por pensar sempre em você.”

Ela morreu nessa madrugada. Sem idade, amando apenas um homem e foi muito feliz por isso. Vou sempre me lembrar da tarde que ouvimos música juntos, do cheiro de seu Capri, de suas cantoras européias e do Campari em seu copo.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Interseção

O casal fica abraçado um tempo após o gozo, os dois corpos cansados e respirando suados e satisfeitos. Ela deita a cabeça sobre o seu peito largo, enquanto passa a mão por suas coxas.

- Sempre gostei de suas pernas.

- Cláudia, eu tenho que levantar.

- Estou te machucando?

- Não. Só tenho que levantar.

Ela fica assistindo enquanto ele procura a cueca, mexendo na cama e ao encontrar se senta e a veste. Depois a calça e então começa a buscar a sua camisa.

- Não quer tomar um banho?

- Vou tomar em casa.

- Pode tomar aqui também.

- Porra Cláudia! Você sabe muito bem que não posso.

- Fala que foi a academia.

- Caralho...

Essa discussão é antiga e sempre termina do mesmo modo. Ela desiste de levar aos limites, dessa vez o orgasmo tinha sido bom o bastante.

- Quer que eu prepare um sanduíche para você?

- Com carne ou daquelas merda de sifú que você come?

- É tofú.

- Se não sangra é sifú.

- Tem rosbife do jantar.

- Tem que ser rápido.

Ele olha para o corpo nú caminhando em direção a cozinha. Essa mulher é linda. Os anos e todas essas manias de saúde, comida vegetariana e chás ainda mantém sua pele firme mesmo entrando nos quarenta.

Ela está preparando a comida enquanto ele a abraça e apóia seu queixo em seu ombro.

- Você é deliciosa.

- O seu problema Paulo é que você sempre ama com seu pau.

- Pensei que era o que mais gostava em mim.

- Só quando me abraça por trás.

Eles não chegam a transar. Ele desce a beija um pouco e a penetra o suficiente para que ela ainda possa sentir que poderia transar com ela novamente se quisesse.

Então veste sua calça e senta para comer o sanduíche.

- Está uma delícia.

- Por que parou?

- Tenho que ir, você sabe.

- Como está com a menina? Qual é o nome dela mesmo?

- Renata. Não quero falar sobre a ela.

- Por que não? Vocês sempre conversaram sobre mim.

- Cláudia!

- O quê Paulo? Não pode falar a sua nova mulher sobre sua antiga amante?

Ele se levanta, deixa o sanduíche pela metade no prato, pega as chaves do carro e abre a porta da casa.

- Você tem que deixar as chaves Paulo, você não mora mais aqui.

- Enquanto não assinar os papéis ainda sou seu marido e aqui ainda é minha casa.

- Vai se fuder!

- Prefiro fuder você.

Uma deliciosa ex-esposa. Uma embriagante e jovem esposa. Um escroque que não consegue separar quem ama de quem deseja.

“Foda-se! Fico com as duas.”

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Noite fria

A bebida desce fácil e aquece nessas noites frias e chuvosas de outono. Arrepio pela memória que não permite esquecê-lo.

“Adoro passar as noites de chuva ao seu lado.”

Sempre dizia isso ao seu ouvido. Dizia pelo sorriso que tentava esconder, maroto e de canto.

Peço mais uma dose de uísque, enquanto dedilho o celular, buscando coragem e pensando se ligo ou não.

Ouvir um não por si só, não me assusta tanto. Estou tremendo pela possibilidade do sim, que certamente faria minha noite valer a pena.

...

Vejo um casal sentado a minha frente. Penso no meu acompanhante ao meu lado, esse que esquenta meu coração e mantêm minha pele fria. O que marca minhas costas e não me dá seu pau para minha boca.

Estou cansada de suas palavras bonitas. Elas não estão servindo para este frio que está além da noite, que trinca meus ossos e faz minha pele gritar por ele.

...

Ele atende. Diz que está acompanhado. Desligo.

Sendo mentira ou não. Não ouço mais o que poderia ter a me dizer. Que busque nos braços alheios o que certamente não terá de mim. Essas sombras.

Viro de uma vez meu uísque e carrego meu parceiro debaixo do braço.

Que a literatura e o lindo poeta morto, seja o prelúdio de minha masturbação noturna de hoje.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Caindo de amor

Passos calmos e curtos, um pé após o outro, na frente do outro, mantendo o equilíbrio e olhando sempre em frente. Uma corda imaginária separa meu corpo do chão, da queda, do movimento abaixo dos meus pés e dos dedos apontando para cima ao homem que caminha no ar.

O vento balança meu cabelo e tenta secar o suor que escorre pelo meu rosto. Estou sorrindo, sempre sorrindo nas alturas, no meu espaço, aonde tudo que me cerca lembra seu sorriso, seus braços e os cabelos loiros brilhando contra a luz.

Estou leve como sempre estive ao lado dela. Consigo ouvir seus sussurros em meu ouvido. Um doce arrepio corre por minha pele, um não sentir de minha roupa tremendo sobre o corpo. Acho que ela diz: “eu te amo”.

Estar apaixonado é isso não é? Um impacto forte, calor e uma dor que te consome por alguns segundos. Vejo as mesmas pessoas apontando para mim de cima. Será que alguma delas já amou assim?

terça-feira, 1 de abril de 2008

Paradoxo

Saindo do banho, perfume, roupa separada e apenas terminando de fazer a barba para ir à festa. Se realmente o que me disseram for verdade, a noite de hoje será uma das melhores.

Estou terminando de fazer a parte debaixo da barba, ainda suja de espuma, surge um clarão acompanhado de um estrondoso som.

No meio da luz surge um senhor. Parece um mendigo, rosto marcado, de roupa gasta e um olhar de espanto encarando a mim e minha casa. E então sorri gritando com seus olhos amarelados.

- Sim! Exatamente como me lembro. Eu consegui!

- Hã... Que porra...

Ele me segura os braços com seus dedos magros e sujos. Me encara da cabeça aos pés e fica me tocando mais do que seria confortável.

- Sim. Jovem e lindo! Eu me lembro de quando era assim.

- Tira as mãos de mim, seu escroto! Como entrou na minha casa?

- Eu venho do futuro. Não tenho como te explicar o modo ou sequer dizer de quando exatamente, mas precisa acreditar em mim.

- Tudo bem, tudo bem. Seu hálito é insuportável, fique longe.

O velho anda para trás me admirando, como alguém que finalmente encontrou tudo que importava em sua vida. Ele mexe suas mãos excitadas e senta no vaso sanitário.

- Tem que acreditar em mim Rogério. Eu sou você daqui a alguns anos.

- O quê?

- Hoje a noite vai ter uma festa. Você vai conhecer uma mulher maravilhosa, incrível, a Deusa que sempre sonhou a que vai calar a boca de todos seus amigos e mulheres que conhece e virá a conhecer algum dia.

- Aham...

- Ela vai destruir sua vida. Depois de se envolver com ela nunca mais será capaz de ser você mesmo. Ela vai te consumir por completo, vai fazer que perca seu dinheiro, que pare de falar com seus amigos, que não encontre mais trabalho, vai perder sua família e sua vida. Ela vai te consumir até não sobrar nada de você.

Uma nova luz surge atrás dele e posso ouvir seus gritos, enquanto desaparece em meio à luz.

- Não importa o que aconteça. Não vá a esta festa hoje. Não saia de casa hoje! Não saia...

Termino de fazer minha barba, visto minha melhor roupa e escolho bem meu perfume. Olho para minha carteira, separo meus cartões e agradeço pela visita deste homem do futuro.

Quase esqueço a camisinha.