Mais uma exposição. Enfadonha, cheia de bebidas baratas, com pessoas vestidas para um espetáculo, que está pendurado na parede e cego, para todas as pompas que rodeiam as linhas ditas ao chão.
O próprio artista já está cansado de balançar a cabeça e sorrir para possíveis mecenas modernos e os possíveis compradores que irão colocar em seus consultórios e firmas de advocacia o que um dia ele julgou ser a expressão de seu ser. Hoje, apenas paga as contas e um divórcio.
Ele sente o cheiro de um perfume acompanhado de curvas de um corpo que faz com que abra caminho para o quadro. Ela encara a peça tempo suficiente para mirar a jovem triste que a encara de volta, faz uma cara de asco e joga o vinho contra a tela.
O silêncio toma a sala, acompanhado de uma crescente cacofonia.
Ela sorri para a peça e deixa uma gargalhada sair de sua garganta deixando visíveis seus dentes brancos e com uma macia língua arroxeada e perfumada de manjericão fresco.
- Senhorita, por favor, me acompanhe. – O segurança a segura gentilmente pelo braço.
- Eu vou pagar pela obra.
- Por favor. – Seu aperto se torna mais firme, deixando a pele ao redor de seus dedos se torne mais pálido.
- Ela disse que vai pagar pela peça. Pode deixá-la.
O segurança o encara e então sorrindo deixa a jovem, os dois estão frente a frente com a peça, que escorre vinho deformando o rosto pintado.
- Não havia pensado nessa releitura da obra.
- O homem que criou essa peça é um idiota. Ele está acostumado a causar dor às mulheres.
- Por que está dizendo isso?
- Olhe o olhar dela. Está nítido que muitas vezes fez mulheres chorarem.
- Ela não poderia estar chorando por nenhum outro motivo?
Ela o encara chorando.
- Esse quadro é um espelho! Vou comprá-lo e destruí-lo!
Ela caminha pela sala, com seu aroma e o som dos saltos se afastando pela porta.
Mais uma vez ele olha o quadro que pintou e nota que o borrar do vinho criou um sorriso de desdém à pintura.
- Um espelho.
Um comentário:
a sina dos pintores/poetas e suas tantas musas.
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