Era a
segunda vez que Rita me tirava de casa em um domingo contra a minha vontade.
Confesso que resistiria com mais afinco se não fosse o tom de sua voz me
chamando ou o modo como ela se vestia sempre que nos encontrávamos. Tinha algo
naquelas roupas que me fazia acreditar que ela tinha se vestido para mim.
- Olha,
eu tenho certeza que você irá adorar. Confia em mim.
Ruas
vazias, crianças correndo ouvindo broncas, uma claridade absurda e uma
companhia de botinhas altas com um vestido de verão andando em minha frente
acompanhada de um sorriso incrível.
- Ele é
um dos maiores artistas Equatorianos, não tem como você não gostar.
- O que
ele faz?
- Cala as
pessoas.
Bato o
olho em dois quadros expostos e já percebo que me arrependi de sair de casa,
mais um imitador de Portinari. Em pensar que poderia estar assistindo a reprise
do jogo de vôlei. Melhor investir em algo depois daqui, assim tenho a certeza
que minha companhia de domingo será frutífera.
- Abriu
um bar com temática japonesa na asa sul. Não sei se você gosta muito.
- Eles
servem sushi?
Vejo um
enorme quadro que me faz pensar o quanto está frio aqui dentro, são enormes
mãos calando qualquer tipo de idéia sobre cantadas. São lágrimas descendo por
um rosto feito em pedra, tanta dor e aspereza que jamais deve ter pertencido a
algo vivo. Então sinto uma mão em meu ombro.
- Ele é
incrível, não é?
- É sim.
Passeio
por algumas galerias lendo o grito de seus rostos. Essa dor congelada e a
angustia que rompe qualquer elasticidade que houve um dia nos músculos que
serviram a essas idéias chamadas de homens. Essa nódoa que é estar vivo sem
entender o propósito, esse peso de uma cobrança além de nossos suportes é a
indelicadeza posta as claras em nossas próprias sombras.
- Sabia
que você iria gostar.
-
Obrigado.
- Sabe?
Acho que vou dispensar o sushi.
- Você já
leu “O Cobrador” de Rubem Fonseca?
Ela me
oferece um sorriso ainda mais irrecusável que seu convite, eu espero
surpreende-la ao mesmo nível.